quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

À janela de Virgílio Ferreira

A rapariga estava sentada a uma mesa numa esplanada sobre o mar. Vestia de branco e era loura mas estava muito queimada do sol. Ao lado da mesa estava montado um guarda sol giratório de pano azul que  criado veio regular para acertar bem a sombra. O criado não perguntou nada e a rapariga pediu um refresco. Era a meio da tarde e o sol batia em cheio no mar, que se espelhava aqui e além em placas rebrilhantes. O céu estava muito azul e o ar muito límpido, mas no limite do mar havia uma leve neblina e os barcos que aí passavam tinham os traços imprecisos como se fossem feitos também de névoa. Na praia que ficava em baixo não havia quase ninguém e o mar batia em pequenas ondas na areia. A espuma era muito branca, iluminada do sol, e o ruído do mar era quase contínuo e espalhado por toda a extensão das águas.

Virgílio Ferreira, Uma Esplanada Sobre o Mar. Lisboa, Difel, s.d.

1 comentário:

J.L. Reboleira Alexandre disse...

Nunca li nada de V. Ferreira, e depois deste excerto, de certeza que não o farei. A prosa pode ser poética, mas quando alguém, ainda na plena posse das suas faculdades,e em 1986, 12 anos depois de Abril, ainda usa o vocábulo «criado»,no sentido que lhe é dado e numa obra que se quer séria (imagino)..... O caminho a percorrer no meu velho país ainda é longo, para que a tão apregoada mudança seja real.