sábado, 20 de novembro de 2010

"Como é que o cônsul aprendeu tão excelente inglês?"

Pittsburgh
29 de Maio, 1873


Meu querido amigo
Recebi a sua bem-vinda carta esta manhã e quando reconheci a letra tremi e empalideci pois nunca esperei voltar a saber de si.
Estive à espera tão ansiosamente por notícias suas e cheguei à conclusão que voltara para a Europa e de que nunca mais o veria. Querido, a sua carta é um raio de felicidade na minha vida; que feliz estou esta noite por saber que está nos Estados Unidos e não nessa desagradável Havana. Imaginei-o com febres, com tudo de pior. Na verdade estive sempre doente desde que deixei Havana e não pode agora dizer que tenho bom ar porque estou magra e com péssimo aspecto.
Sobre a sua vinda a Pittsburgh: claro que virá e de depressa também, querido, porque até lá sentir-me-ei quase louca. Quando vier terá que tomar um coche porque os transportes públicos estão interrompidos pelo arranjo das vias mas terá de mencionar ao condutor os Bidwells, em Oakland, ou irá certamente parar aos meus tios.
Que feliz me sentirei por vê-lo uma destas tardes pelas 2 horas, meu querido, não posso esperar e seria melhor não vir demasiado cedo pois isso não agradaria à Mamã e ao Papá, mas tenho que lhe contar o que eles disseram da sua carta. Depois de a ter lido, levei-a ao quarto do Papá e disse-lhe que tinha uma carta muito simpática de um amigo e que gostaria que ele a lesse à Mamã. Leu-a e disseram ambos que era uma carta estupenda. Mollie, como é que o cônsul aprendeu tão excelente inglês? E como é que foi querido? Deve ter feito progressos desde que chegou a Nova Iorque porque não fazia ideia que pudesse escrever um inglês tão bom: esteve este Inverno numa boa escola.
Quando chegar não diga a ninguém que eu escrevi esta carta, porque embora o Papá não o tivesse proibido, sei que ele preferia que eu não a tivesse escrito.
Agrada-me saber que está contente com o nosso país, custa-me a crer que gosta dele como diz, mas pode dizer-me tudo o que pensa dos bárbaros quando nos encontrarmos.
Espero que desculpe esta escrita já que escrevi à pressa, por ser tarde.
Meu querido, devo dizer-lhe adeus até o ver, o que espero não demore muito.
Penso que agora me sentirei melhor, porque me afligi continuamente consigo. Graças a Deus está completamente a salvo desse mar medonho e estará dentro em pouco comigo. Que felicidade!
Sempre sua
M.

Cartas de Amor de Anna Conover e Mollie Bidwell para José Maria Eça de Queiroz, cônsul de Portugal em Havana (1873-1874). Lisboa, Assírio & Alvim, 1998. P. 80-81.

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