sábado, 1 de agosto de 2009

Noites de Verão na Foz do Arelho

O texto em baixo, exumado do fundo de um baú com mais de 4 décadas, pretendia ser um roteiro jornalístico da noite da Foz do Arelho. Foi elaborado na perspectiva de um adolescente de 16 anos que passava duas semanas das suas férias de Verão na Colónia de Férias Marechal Carmona (FNAT, hoje INATEL).
Os pontos de referência eram, além da própria Colónia de Férias, o Hotel Facho, o restaurante Félix, o Parque de Campismo, a aldeia da Foz com a sua praça e o café Caravela. Descontando as lacunas de informação imputáveis à idade e experiência do autor, cada um destes pontos de referência é sumariamente caracterizado: a pequena burguesia forasteira da FNAT (que a si própria se denomina de "colonos"); o cosmopolitismo dos frequentadores do Facho (franceses, ingleses, alemães); os grupos "aventureiros" de campistas; as caldeiradas do Félix à espera das quais os clientes se impacientam; os jovens locais que à noite dançam na praça ao som do acordeão e de dia se encontram no Caravela, os grupos de fadistas improvisados e contadores de anedotas que se formam à noite junto ao cais da lagoa, a figura de um "playboy". Por entre as descrições, nem sempre muito realistas, alguns apontamentos que identificam um ambiente e uma época: os cantores do momento (Simone de Oliveira, Rita Pavone, Marisol), os "azes" do ciclismo (Peixoto Alves, Mário Silva, João Roque), or jornais da tarde, a televisão (ou ausencia dela), as bateiras e a pesca ao candeio, o pick-up e o twist, o MG, o acordeão, a esquizofrenia de uma aldeia no Inverno/vila no Verão, os rapazes de cabelos compridos, blue jeans e sapatos de tacão de madeira, os jogos de sociedade e de salão (na Colónia, no Facho, no Caravela).
O leitor de hoje será, espero, tolerante com o estilo um pouco pretencioso, aqui e ali de gosto pouco apurado, deste juvenil escriba, candidato a jornalista. Leitor ávido de Baptista Bastos e Mário Ventura que no Diário Popular desse ano de 1965 publicaram uma série de reportagens sobre a noite algarvia, julgou-se com fôlego para fazer da Gazeta um émulo daquele vespertino. Da sua tentativa esforçada, o que chegou até nós terá somente o mérito de poder suscitar outras memórias, porventura mais coloridas.
E se, num plano literário, o adolescente desajeitado não constitui exemplo, este texto parece ainda hoje despertar uma sâ nostalgia de um tempo em que na Gazeta das Caldas "impunemente" se afirmava: "Diabos, não há quem não seja poeta nas noites da Foz do Arelho".



4 comentários:

João Ramos Franco disse...

Caro João Serra
Por simples acaso não posso ser uma das pessoas que retratas, estava em Angola nesta data. Não fosse esse acaso estaria nas "Noites de Verão na Foz do Arelho", como uma daquelas personagens anónimas…
Este texto em nada descobre a idade que tinhas ao escreve-lo. Mostra-me uma realidade, o caminho que percorreste e o que és hoje.
Acredita que nostalgia do passado me percorre, ao ler este texto…
Talvez provoque em mim um desafio, para recordar toda a imagem que tão bem retratas e eu recordar a minha…
Um abraço amigo
João Ramos Franco

J J disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
J J disse...

Só muito mais tarde conheci as noites da Foz. Não só por ser mais novo mas porque a Foz era para nós apenas uma praia onde passávamos as manhãs e algumas tardes, as noites eram sempre nas Caldas, eventualmente em Óbidos. Recordo apenas umas entradas clandestinas nuns bailes da FNAT.

Foram pois para mim uma novidade e um prazer ler estas crónicas, que são melhores do que o autor as pinta.

A "minha" Foz nocturna é já nos anos 70 no Tabaco, depois no Solar da Paz, Green Hill...

VT disse...

Trata-se, não só, de um belo retrato do que acontecia durante o Verão numa pequena estância balnear da Província, naquela época - com a vantagem de ter sido realizado na própria altura "ao vivo e a cores" -, filtrado pelo olhar de um jovem, mas também uma narrativa que nos permite perceber que o autor para além de ter feito o texto com "paixão" possui, já aos 16 anos, uma notável (e pouco comum para a idade) capacidade de observação e de descrição. Compreendemos melhor, em consequência, o caminho que viria a ser percorrido pelo autor.
Abraço
VT